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TEMPO - O DESERTO DOS TÁRTAROS

Atualizado: 1 de abr. de 2020

O tempo corre e às vezes não vemos. Projetamos um futuro e esquecemos de viver o presente. Deixamos oportunidades passarem, porque temos medo. Quando chegamos ao futuro desejado tanto tempo antes, então, percebemos que a vida passou, as oportunidades passaram, e nós, presos àquela ilusão de felicidade, envelhecemos.

O deserto dos Tártaros mostra, de um jeito um pouco monótono e arrastado, como a vida passa.


Tudo começa quando Giovanni Drogo é recrutado, assim que sai da academia militar, para servir no Forte Bastiani, que construído muitos anos antes, com o objetivo de conter o inimigo do Norte, já se tornara decadente. Ao chegar, todo o entusiasmo por mudanças, pela vida adulta, por ter um objetivo e uma missão desaparece ao descobrir a real situação. Drogo, dominado pela decepção, pede transferência, entretanto, seu superior o convence que isso seria ruim para seu histórico. Assim, decide esperar quatro meses até a avaliação médica e alegar problemas de saúde. Quatro meses se passam e Drogo não percebe a velocidade do tempo. E, do mesmo jeito, foi convencido a completar o tempo resignado. E é deste jeito que Giovanni Drogo define o seu destino. A infinita espera pelos inimigos, a ilusão que um dia haverá guerra, a esperança de mostrar o seu valor. A eterna expectativa de dar sentido à vida.


De monótona, a narrativa passa a ser repleta de aflição e angustia.

Anos vão se passando, junto com eles a juventude do nosso protagonista. Longe do forte, e da narrativa, a vida vai passando, e durante uma licença, Drogo volta para casa. Ao chegar e se deparar com uma rotina diferente, pessoas mudadas, amigos desconhecidos, Giovanni se convence que todos mudaram, mas ele continuava o mesmo. Pois claro, a passagem do tempo não fora percebida. É nesse ponto da vida que as oportunidades começam a chegar e irem embora.


A falta de coragem, a demora nas tomadas de decisões e o conformismo passam a acompanhar a vida no forte. Seguindo a mesma rotina durante gerações, o forte cada vez mais se parece com uma prisão. Toda aquela

esperança e expectativa começam a sumir de Drogo. Entretanto, com medo de não estar presente no momento da guerra, e até mesmo por estar em sua zona de conforto, é impossível pedir despensa ou, simplesmente ir embora.


É impossível não se identificar, com as personagens em algumas passagens do livro. Quantas vezes, por falta de segurança, por medo de mudanças e outras mil razões deixamos oportunidades passarem? E quantas vezes não nos pegamos pensando em realidades paralelas? “Como estaria hoje se eu tivesse escolhido diferente?” “Por que não fiz aquilo?”


Neste livro, o italiano Dino Buzzati brinca, de uma forma muito realista, com a vida real. Se arrasta por algumas páginas, do mesmo modo que os dias se arrastam durante os tempos maus, quando nos falta energia e alegria. E, sem mudar o estilo da escrita, capítulos voam do mesmo jeito que anos se passam sem que notemos, e, quando olhamos para trás, se foram embora sem serem vividos. Angustia e solidão são assuntos presentes em quase todas as páginas, principalmente quando Drogo percebe que o mundo fora do forte já lhe é estranho, e, assim, sem se adaptar novamente à vida de civil, lhe resta o confinamento no lugar que há muito tempo passou a desprezar.


Em suas últimas páginas, Buzzati e Drogo demonstram como a vida pode ser decepcionante e repleta de indignação.


DINO BUZZATI:


San Pellegrino di Belluno, 16 outubro de 1906 – Milão, 28 janeiro de 1972



Escritor, jornalista, pintor, dramaturgo cenógrafo, figurinista e poeta italiano. Trabalhou quase toda a vida no jornal Corriere della Sera como cronista, redator e correspondente especial. Autor de um grande número de romances e contos, pode ser comparado a Kafka (mais para diferenciá-los do que os aproximar). Publicou Bàrnabo delle montagne (O Barnabo das montanhas), seu primeiro romance em 1933; e em 1935 Il segreto del Bosco Vecchio (O segredo do Bosque Velho). O deserto dos Tártaros veio a ser publicado em 1940. Como pintor ilustrou alguns de seus livros, e declarou que era “um pintor que, por hobby, durante um período, infelizmente bastante longo, fez-se escritor e jornalista”. Assim, justificou porque seus quadros não eram levados a sério.




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